Uma semana sem notificações

Eu passei essa última semana com as notificações do meu celular desativadas e tudo fluiu bem. Bem demais, até: eu não perdi nada importante. Segundo o Tempo de Uso do iPhone, o meu número de ativações do celular também não aumentou com isso. Eu imaginei que aumentaria porque eu ia verificar o WhatsApp ou o iMessage com mais frequência para ver se eu não perdi uma mensagem dos meus amigos e da minha família, mas não aconteceu. Um dos motivos é que durante o trabalho eu uso o WhatsApp no navegador, então não preciso ficar conferindo o celular de tempos em tempos.

Eu me inspirei a fazer isso a partir desse texto de Maxime Vaillancourt, sobre como transformar o celular em uma “ferramenta chata”:

Let’s open up an imaginary toolbox for a moment. Imagine a screwdriver.

A screwdriver is a tool in its purest form. It does not ask for anything, does not require maintenance, and doesn’t distract from the task at hand. It just sits there, patiently waiting to be picked up when needed.

A tool does its job, then gets out of the way.

This is the kind of relationship I want with my smartphone. It should be tool, and nothing else. With that in mind, I set out to turn my smartphone into a tool again. This “tool, not distraction” mentality is useful for all kinds of modern technology, not just smartphones. Cal Newport’s “Digital Minimalism” covers this idea pretty well too (view my reading notes).

A primeira dica que Vaillancourt oferece é desativar as notificações, e é algo muito eficaz. A gente é bombardeado por interrupções do celular para chamar a nossa atenção. Eu sempre fui muito atencioso quanto a quais notificações eu ativo — apps como iFood, Uber, Moovit nunca tiveram notificações ativadas no meu celular, por exemplo — mas mesmo assim o número de interrupções é grande.

O único aplicativo que eu senti falta das notificações foi o Lembretes. Eu uso bastante ele já faz alguns anos pra organizar as tarefas da minha rotina e, embora eu lembre das minhas tarefas, eu gosto da pequena dose de dopamina de dever concluído que é em marcar as notificações como concluídas. No fim das contas, o lembretes e o calendário são os únicos aplicativos que eu reativei as notificações hoje (o app Tempo tem a opção de enviar notificações críticas, o que eu mantenho ativado porque eu vivo em Porto Alegre, afinal de contas).

Vaillancourt sugere ativar um filtro de escalas de cinza no celular, algo que eu já uso, e a desinstalação de apps desnecessários. O filtro de escalas de cinza é algo bem profundo que eu acho que muita gente não adotaria, mas a dica de desinstalar apps desnecessários é ótima. O iPhone tem um auto-desinstalador de apps pouco usados, mas eu não gosto dessa abordagem. Ele costuma desinstalar apps que a gente usa com pouquíssima frequência, e no meu caso são apps como o do plano de saúde, ou do FGTS. O problema é que, quando eu preciso desses apps, eu preciso deles na hora, e dentro de um hospital o sinal de internet pode ser fraco (já aconteceu!). Minha dica é sempre dar uma conferida na lista de apps do seu celular e ser bem honesto consigo mesmo. Eu tô sempre apagando um ou outro app que não faz mais sentido ter. É incrível como nossa rotina digital muda bastante.

Esconder esses apps de pouco uso é bem eficaz também. Desde que o iOS implementou a “biblioteca”, movendo todos os apps pra uma lista categorizada e liberando sua tela de início para você definir quais apps e widgets você quer ver, eu mantenho uns oito apps no máximo. Atualmente são esses:

  • How We Feel
  • Gentler Streak
  • Fitness
  • Diário
  • Babbel
  • NetNewsWire
  • GoodLinks
  • Música

Outros apps aparecem como widgets rotativos — Tempo, Lembretes, Calendário, Mail por exemplo — porque geralmente só dar uma olhada na informação mais importante deles é o suficiente.

Essas mudanças me fizeram gostar mais do meu celular nessa última semana. Prestar atenção em como ele funciona pra mim é importante, e me ajuda a definir uns fluxos com o Atalhos, por exemplo. O celular nunca vai ser tão versátil quanto um computador, mas eu acho que boa parte do meu carinho pelo computador vem da atenção que eu dou a como ele funciona, como ele está organizado, etc. O celular tenta ser opinativo demais nesse sentido. Ele prefere que eu me adapte a ele, e não o contrário. Com um pouco de atenção e dedicação, eu acho que tô chegando num bom meio termo.

Minha dieta cultural na última semana #4

Hoje tá um dia lindo e a temperatura está gostosa. 21°C e ensolarado, com uma brisa leve e gostosa. Vou passar a tarde na praça lendo com o Tobias… mas agora pela manhã, eu tô fazendo feijão. Ontem saí de um dia bem bomba porrada e tiro do trabalho e desci aqui no bar do lado de casa pra tomar uma cerveja com o Erê e me senti bem feliz por ser brasileiro. Sensação boa, essa.

Em outras realizações sobre ser brasileiro, eu decidi que Vale Tudo vai ser a última novela que eu vou acompanhar. Vale Tudo não é tão boa assim (é mais divertido assistir pra falar mal com os amigos) e gasto um tempinho pós-trabalho que eu queria gastar fazendo outras coisas. Como Vale Tudo deve acabar em setembro, e setembro tá logo ali, logo mais vou ter uma mudança na rotina. Vamos ver como vai mudar minha dieta cultural semanal. Vou avisando por aqui.


Filme: Wanda (1970).

Wanda e o sr. Dennis olham para o céu bem azul. Wanda está apoiada no carro, e o sr. Dennis está em pé no teto do carro

Wanda é o único filme dirigido por Barbara Lorden, e que pecado isso, porque Wanda é magnífico. Eu descrevi pro Erê como se John Cassavetes tivesse dirigido o Acossado de Jean-Luc Godard, mas isso não faz justiça ao trabalho de Lorden na direção e na atuação. É justamente na confusão entre as duas coisas que o filme brilha: direção e atuação estão tão intrinsicamente ligadas nesse filme que parece que Lorden controla a câmera com seu olhar, de tanto que a imagem absorve seu estado de espírito em cena. É um filme tão perdido quanto sua personagem principal, que com sua falta de rumo acaba se relacionando com um assaltante e fugindo com ele. Mas Wanda não tem uma “trama” em si. Ela segue acontecimentos que em outros filmes talvez fossem becos sem saída. Mas aqui tudo revela algo sobre Wanda, mesmo que nem ela saiba o que é.


Jogo: The Legend of Zelda: Ocarina of Time 3D (Nintendo 3DS).

Link e Navi se encontram com a Grande Árvore Deku

Comecei a jogar a versão para o Nintendo 3DS de Ocarina of Time, que eu considero a melhor versão do jogo. Eu tô bem no início — eu acabei de encontrar a Zelda e logo mais vou para Kakariko Village antes de seguir para a vila dos Gorons.

Sempre me esqueço como esse jogo é triste. Sua primeira missão acaba com a morte do seu mentor, e tem uma melancolia já na tela de start que define o tom do jogo todo, mesmo quando ele é bobo (Gorons!). Eu jogo ele no meu New 2DS, que eu particularmente acho o melhor videogame que a Nintendo já fez, e embora o jogo ainda tenha os visuais do Nintendo 64, eu acho ele lindo. Seu trabalho de animação é fantástico, e seu uso esparso das cores é muito inteligente (mesmo que tenha sido uma limitação de hardware). Eu geralmente empaco no reino dos Zoras, vou ver se dessa vez eu avanço mais.


Série: Alien: Earth (primeira temporada, episódio 4).

Uma andróide perto de um painel cheio de botões e alavancas

O episódio dessa semana anda mais com a narrativa, mas eu ainda acho todo o uso da história de Peter Pan aqui meio cansativa. Não consigo parar de comparar com a série de Watchmen que a HBO lançou há uns anos e que usa uma paródia de American Horror Story para pontuar a série também. Mas lá era algo muito mais pontual. Em Alien: Earth a série para pra alinhar a analogia com os personagens o tempo todo. Pelo menos um Xenomorfo nasceu no fim desse episódio, o que é sempre um bom sinal. Logo mais começa o carnaval.


Livro: Uma Visão Pálida das Colinas (de Kazuo Ishiguro).

Capa do livro

Ok. Eu cheguei na parte que Ishiguro decide tirar seu chão. Eu tô nos finalmentes do livro. Pelo que diz o progresso no ebook, 68%, mas a progressão é muito rápida, acho que acabo ele esse fim de semana. É incrível como Ishiguro torna um livro bastante interno em um virador de página com muita facilidade. Acho que semana que vem já vou ter mais ideia de onde esse íntimo todo vai dar. Por mais que o livro esteja desabrochando agora, eu não tenho ideia de onde ele quer chegar (e que sentimento legal esse).

Vivi: cinco anos com, seis anos sem

Hoje completam seis anos da morte da Vivi. A partir de hoje, o tempo que eu sinto saudades da Vivi é maior do que o tempo que eu tive perto dela. Foi a primeira coisa que eu pensei quando acordei.

A chegada da Vivi na nossa casa começou com tristeza. Por semanas, ela viveu na frente do nosso pátio, embaixo de um caminhão estacionado na frente da casa de um vizinho. Eu lembro de ter ido lá mais de uma vez dar comida pra ela. Um dia, nós demos comida para ela dentro do nosso pátio, e fechamos o portão. Naquela noite, Vivi conseguiu furar a cerca e fugir pro pátio do vizinho, onde os cachorros dele a atacaram, quebrando sua coluna. Eu lembro de ouvir um barulho de briga durante a noite, mas não juntei os pontos. Tem sempre alguma intriga canina na vizinhança.

Vivi ficou em um dos quartos da casa, onde bate sol e é bem iluminado, e minha mãe a ajudou a se apoiar nas patas dianteiras nos dias seguintes. Ela reaprenderia a caminhar em algumas semanas, e um vizinho nosso iria lá em casa com uma cadeirinha de rodas feita de canos de PVC. Foi durante esses dias, com a Vivi ainda no quarto, que ela ganhou o nome. Minha mãe pensou em Vitória. Virou Vivi.

Eu lembro muito da Vivi desde que ela morreu. Eu já falei sobre esse dia aqui. Dói demais pensar nele, e no meu envolvimento naquele dia. Nada me tira da cabeça que a roupa que eu coloquei nela naquela noite, alguns dias depois de ela ter feito uma cirurgia, estava apertada demais. Pra mim, desde então, eu matei a Vivi.

Mas Vivi viveu uma vida inteirinha. Quando ela aprontava, virava Viviane. Ela fazia uma expressão afrontosa quando a gente xingava ela. Eu acompanhava ela no banheiro antes de dormir (desde o acidente, como eu chamei aquela noite, ela não conseguia mais se segurar). Durante aqueles anos, eu dormi com o colchão no chão. Eu podia colocar a mão dentro do berço dela até ouvir ela roncar (e, leitores, ela roncava). Por muitos anos depois dela, meu colchão continuou no chão.

Eu gosto de lembrar do meu último ano da faculdade quando eu lembro da Vivi. Eu tinha aulas presenciais só uma vez por semana, e nos outros dias eu trabalhava e escrevia o trabalho de conclusão, o que eu tentava deixar para a manhã. Durante as tardes, eu e minha mãe sentávamos na sala com a Vivi e assistíamos séries e filmes. Foi quando a gente maratonou The Wire e Hannibal, acompanhamos a última temporada de The Leftovers ou passamos uma tarde inteirinha assistindo The Keepers. Um de nós sempre sentava no chão, o braço dentro do bercinho da Vivi enquanto ela tirava a soneca da tarde.

Nos dois anos seguintes, quando eu voltei a trabalhar como desenvolvedor, eu usei o quarto vago em que Vivi ficou até se recuperar como um escritório. Durante horas, Vivi ficava lá, deitada no sofá por um tempo, depois apoiada no meu pé. As vezes ela enchia o saco de me esperar e ia para a rua sozinha, na cadeirinha dela, para brigar com os cachorros do vizinho. Ela nunca perdeu a coragem.

Nos últimos meses, quando sua saúde foi piorando, eu gostava de passar os fins de tarde com ela explorando o pátio. Eu saía pouco do quarto naquela época, mas era ela quem me levava. Todos os dias. Eu amei ela tanto.


Eu sonhei com a Vivi há uns dias. Eu sonhei que eu chegava na casa dos meus pais em um dia de sol. Acho que era na época que eu ainda trabalhava no escritório, porque eu chegava de carro com meu pai. Minha mãe me deu oi e só me disse “ela tá lá embaixo”. Eu sabia instintivamente quem era. Eu desci as escadas e, embaixo da laranjeira, estava a Vivi, a cadeirinha de um lado, Mel de outro. Eu sentei perto dela na grama e lembrei que ela tinha morrido, e percebi que aquilo era um sonho. Eu acordei e, pela primeira vez em muitos, muitos anos, eu lembrei de como foi viver com a Vivi, ao invés de lembrar de como ela morreu.

Vivi sentada na grama, ao lado da cadeirinha de rodas dela

Vou fazer um experimento essa semana: desativei todas as notificações no celular. Nem mesmo o calendário e os lembretes se salvaram.

Meu objetivo é ver quais notificações são realmente essenciais pra mim (suspeito que nenhuma) para poder reativar na semana que vem. Também quero ver como meu celular se comporta. Por exemplo: se eu desativar as notificações do telefone e do FaceTime, eu não receberei chamadas desses apps?

Vou atualizando por aqui durante a semana.

Quinta-feira eu instalei o Haiku em uma máquina virtual e tenho brincado desde então… é um sisteminha bastante usável? É super rápido, e a interface é muito bem pensada. Me deu saudades verdadeiras do macOS na época do Snow Leopard, quando botões eram botões e as coisas faziam mais sentido do que os espaços em branco do macOS desde o Big Sur. Tô pensando em pegar um computadorzinho velho em um OLX da vida e instalar ele e ver o que dá.

Minha dieta cultural na última semana #3

Tá chovendo bastante por aqui hoje. Dá pra ouvir o vento subir correndo a escadaria aqui do lado de casa. Não vou mentir, eu tava torcendo por essa chuva. Minha semana foi tão movimentada que eu tava torcendo por uma chuvinha pra me forçar a ficar quietinho em casa, tomando café e vendo Gilmore Girls.

Não quero prometer nada, mas quero escrever mais essa semana. Eu fiquei feliz de ter organizado meu tempo bem o suficiente pra conseguir caminhar todos os dias, e pra estudar francês todos os dias. Quem sabe eu vou conseguir escrever todos os dias mais pra frente? Não custa tentar.


Filme: Hard Truths.

Cena de Hard Truths: uma irmã olha preocupada para a outra — as duas estão sentadas lado a lado

Hard Truths (2024) é incrível. Eu amei toda a primeira parte, quando ele se estrutura de um jeito quase que como um filme de esquetes — vemos quatro mulheres, cada uma em um punhado de situações pequenas, e como elas reagem às adversidades dessas situações. Lentamente, Mike Leigh vai tecendo as tramas ao redor delas — as irmãs, a morte da mãe, a relação delas com suas respectivas famílias — sem pressa e sem julgamentos. Criamos uma antipatia tremenda (e muito bem humorada) com Pansy, uma mulher furiosa com sua própria vida e interpretada com uma força descomunal pela Marianne Jean-Baptiste (que se reúne com Leigh depois do magnífico Segredos e Mentiras). Ela é cruel com seu filho, com seu marido, com sua irmã, com suas sobrinhas, e com qualquer pessoa que ouse estar perto dela. Hard Truths é sensível o suficiente para nos mostrar as causas da dor de Pansy, mas não as vê como desculpa para a dor que ela aflige. É incrível, então, que ao final do filme você está aos prantos querendo o melhor para Pansy, que ela consiga se livrar dessa dor tremenda que ela carrega e que ela despeja por aí. Jogada de mestre.


Séries: Alien: Earth, Community.

Cena de Community: o grupo de estudos está sentado ao redor da mesa na biblioteca olhando para Jeff, que está em pé (fora de cena)

Terceiro episódio de Alien: Earth não leva a lugar nenhum. Nem sempre isso é um problema. Várias séries se enriquecem em episódios onde “nada acontece” mas tudo acontece também. A gente conhece mais os personagens, ou a série aproveita a falta de movimento para aprofundar as dinâmicas. Não acontece aqui. “Metamorfose” (S01E03) só existe para jogar migalhas dos mistérios que já tínhamos pegado nos dois primeiros episódios — o que a Weyland-Yutani quer? Qual o limite da humanidade dos “meninos perdidos”? Até onde a série vai abraçar essa analogia com Peter Pan???… Meu pé atrás com o Noah Hawley tem seus motivos.

Comecei a rever Community (S01E01 — S01E03). Sempre me impressiono ao lembrar como a primeira temporada tem um coração gigante pra esses personagens. É uma temporada que mostra porque as pessoas se tornam amigas. Muito desse espírito se perde ali pela terceira temporada, quando ela abraça os episódios temáticos com força, mas é justamente o que deu a força pra Community ser o que quisesse em cada episódio.


Jogos: Herdling.

Captura de tela de Herdling, com o protagonista correndo com os caricórnios no meio de um vale

Tava empolgado fazia um tempo pra jogar Herdling (Okomotive), é um jogo em montanhas e me lembra muito os Andes. Eu acho que a versão pro Switch é bem ruim: tem problemas sérios de performance e as texturas parecem ser de jogo do Nintendo 64. Eu imagino que isso é fruto do fato de que o estúdio não recebeu dev kits do Switch 2 antes do lançamento do jogo, e eu espero que eles lancem algumas atualizações para melhorar a performance do jogo no console. Ele parece muito bonito, mas esse port é um pouco desleixado.

Além de Herdling, eu joguei os jogos da rotina também: Breath of the Wild (tô indo pro Domínio de Zora) e Animal Crossing: New Horizons (fiz nada na ilha essa semana, mas tentei pegar o Blue Marlin).


Música: Nina Simone, The Tomato Collection.

A capa do CD “The Tomato Collection” sobre a minha cama

Encontrei o CD duplo da coletânea The Tomato Collection (1994) da Nina Simone essa semana. É o mesmo disco que toca durante os momentos finais de Antes do Pôr-do-Sol (Linklater, 2004). Esse CD não existe no Apple Music (e não existia no Spotify quando eu tinha uma conta lá), e a única cópia que encontrei para baixar tinha algumas faixas cortadas — “Porgy” e “But Beautiful”, e “When I Was In My Prime” tinha uma deforminade no final.

O CD, em dois volumes, tem um livreto com um ensaio sobre a curadoria da coleção, e tem algumas das minhas versões favoritas de “Just in Time” (a música que toca no filme do Linklater), “See-Line Woman” e “Ain’t Got No”. Acho que a maioria é ao vivo.


Livro: Uma Visão Pálida das Colinas.

Capa do livro

Cheguei na metade do livro, começando a segunda parte, e ainda sinto que ele tá escondendo o jogo de mim. No outro livro de Ishiguro que eu li esse sentimento era comum também, mas a essa altura do livro já dava pra ver que o autor estava desenhando algo. Uma Visão Pálida das Colinas se limita tanto ao ponto de vista de sua protagonista que as limitações dela sobre as outras pessoas (seus anseios, suas frustrações) parece ser a própria história. Não é ruim em nenhuma página, vale dizer. É tão bom estar imerso na mente de Etsuko e naquilo que ela não sabe (principalmente as circunstâncias da vida e morte de sua filha mais velha, Keiko). Toda a realização que Etsuko tem é feita com sutilezas, como uma paisagem que se revela devagar na neblina. Eu ainda acho que o livro vai tirar o meu chão — e talvez o faça justamente dessa forma silenciosa.